terça-feira, 16 de março de 2010

Novela Malhação: Alê e Valter

Sempre que posso digo que tenho orgulho da Rede Globo de televisão. Sim, tem inúmeros defeitos como nos empurrar muito conteúdo vazio e "pipoca" (Faustão entre tantos outros). Sim, em vários momentos apresentou jornalismo tendencioso e/ou chapa branca, inclusive na ditadura militar.

Apesar de concordar que novelas são imbecilizantes, especialmente as focadas em públicos muito específicos como Malhação, admito que às vezes assisto para "desligar" o cérebro e parar de pensar em problemas. No passado fui muito mais noveleiro.

Inclusive por novelas de inegável valor histórico, cultural e artístico como Tieta, Roque Santeiro, a primeira com a Dona Armênia (Rainha da Sucata) entre tantas outras, a produção de séries e manutenção de um padrão de qualidade inegável e invejável, a empresa se destacava dentro e fora do país como produtora de conteúdo com qualidade e quantidade. Nacional, em bom português, documentando regionalismos e caracteres brasileiros de forma realmente artística.

Apesar disso tudo, como no resto do mundo observava-se que minorias eram muito pouco representadas. Numa época em que a TV era a janela - e ainda é - da maioria dos brasileiros para o mundo, negros, asiáticos, deficientes físicos, homossexuais, dentre outros grupos, ou eram timidamente representados, ou simplesmente esquecidos. Isto claro tinha e tem impacto na população, especialmente nos jovens. É difícil conviver sem preconceito quando se desconhece no mínimo o "diferente". É difícil para a auto-estima de jovens LGBT a passagem pela difícil e sempre pedregosa adolescência sem modelos com os quais se identifique e que considere "positivos".

Até os 17 anos, quando fui morar nos EUA, só conhecia de gays o Jorge Lafond, a Rogéria, a Roberta Close e um cabeleireiro da cidade em que morava - estes todos aprendi a admirar e a compreender de alguma forma com o tempo. Foram corajosos que permitiram os avanços nos direitos e garantias mínimas ao indivíduo que, infelizmente, ainda não são universais nem adequados. No último ano do ensino médio, em uma escola americana, dei-me conta de que, por nunca ter estudado em escola pública no Brasil, nunca tinha tido um(a) colega de classe negro.

Aos poucos conceitos como igualdade, visibilidade e tolerância (prefiro respeito) foram se consolidando na sociedade e obrigando mudanças. Mesmo assim a comunidade LGBT sempre ressentiu-se da falta de um personagem positivo, um casal real, que inclusive incluísse o tão esperado e sempre vetado beijo gay. Aos poucos (sempre) foram surgindo personagens menos estereotipados, com mais participação, e a MTV-Brasil foi pioneira e corajosa em televisionar o primeiro beijo gay. Infelizmente, sem a abrangência nem audiência nacional da Rede Globo.

A Rede Globo é carioca e brasileira. O Rio e o Brasil, já disse aqui, possuem populações que mesclam desinformação, preconceitos e provincianismo/atraso. Por isto reconheço mérito na coragem do autor e da empresa ao retratarem de forma (talvez) realista personagens gays na adolescência, seus dramas, seus méritos, questões familiares. No último capítulo falaram sobre aceitação pela família, o famoso "sair do armário". Malhação é um formato de sucesso por ser a novela que se mantém pelo maior tempo contínuo na emissora, e o tema sempre foi polêmico e socialmente explosivo. Há histórico de perdas de patrocínios e anunciantes no exterior e no Brasil. Por isto acho que a empresa foi corajosa. Também via como uma dívida, mas reconheço as barreiras abjetas. Mas o enfrentamento, ainda que tímido e parcial, não elimina o mérito da tentativa nem a constatação da intenção a meu ver necessária - nem por isto presente - e corajosa ao abordar o assunto de forma mais direta.



Ainda não sei se o beijo que a comunidade LGBT brasileira quer ver acontecerá. Não sei o desfecho da trama, mas achei estes dois vídeos positivos. (O de hoje - 15/03/10 ainda não está disponível). Mas que contribua para a visibilidade, a auto-aceitação, o respeito às diferenças, a compreensão e finalmente, ao combate à homofobia.

Pessoalmente, considero leis contra preconceitos pouco eficientes. Acredito na Educação e na Justiça como invenções humanas que passaram a promover o avanço e predomínio do que há de bom na humanidade. Contudo, não sou a favor de cotas ou leis criminalizantes, e sim entendimentos sociais de que democracia não é a ditadura da maioria e DEVE incluir sólido respeito aos direitos e garantias fundamentais do indivíduo. Os indivíduos LGBT devem ser respeitados apenas por serem portadores destes mesmos direitos, iguais a todos, nem mais nem menos. Inclusive o de ver-se retratado(a) em uma personagem de TV que possa gostar de sim mesmo(a), namorar e, porque não, beijar como todos?

Lembro que os direitos são da emissora e os trechos exibo aqui com fins de exemplificação.

7 comentários:

Unknown disse...

A Globo realmente,(apesar de tudo que você disse,e concordo),tem tentado quebrar barreiras,e às vezes,conseguido.Também fiz intercâmbio nos EUA,o que paradoxalmente,me fez enxergar melhor o Brasil.Também Rogéria,Lafond e tantos outros ajudaram muito mais do que se pensa a causa gay(muita garotada de hoje não vai concordar,but...).
Torço para que o beijo gay aconteça:como um símbolo,um símbilo de visibilidade.
Parabéns pelo texto.(escreva mais textos longos!)
Abração.

Serginho Tavares disse...

gostei muito do texto e concordo com você
são com coisas assim que vai se fazendo a cabeça das pessoas
cresci vendo tv. monteiro lobato e tv globinho com paula saldanha e seu cabelão comprido que me fizeram ter prazer por cultura, geografia, literatura...
ver que hoje em dia se abre o debate para a homossexualidade é sempre muito positivo

unknown disse...

O seu texto disse TUDO sobre essa questao. Os homossexuais, e as pessoas em geral, merecem ser respeitadas por serem cidadãs,e ter os mesmos direitos. além disso acho essencial ter uma história GLBT que pareça mais com a realidade (:

Alexandre Lucas disse...

Agradeço os comentários gentis. Quanto aos posts mais longos, há vezes em que eles nos obrigam a sentar e colocar aquilo para fora. A necessidade de partilhar um pensamento, uma opinião, um sonho ou fantasia.

Fernando disse...

" A Rede Globo é carioca e brasileira. O Rio e o Brasil, já disse aqui, possuem populações que mesclam desinformação, preconceitos e provincianismo/atraso. "

Alexandre, super sei que voce é a ultima pessoa da blogsfera que vai se preocupar com comentario ou critica de leitor, mas... desnecessario o trecho, cara. Como carioca, e principalmente defensor de que essa coisa Rio x SP é uma discussao completamente retrogada e datada, achei que caiu bem mal essa frase.

Nao sei se foi essa a intencao, mas preconceito, provincianismo e atraso derivam de subdesenvolvimento. E SP ainda se inclui bastante nessa categoria, até mesmo por ser parte (vital) da economia do pais.

Enfim, abracos,
Fer

Alexandre Lucas disse...

Fernando,

Só não publico o comentário quando é grosseiro ou ofensivo. Elogiei a Globo e citei o Rio por ser sua sede. São Paulo, como o resto do Brasil, também considero provinciana neste aspecto. Não foi intencional esse desdobramento. Por coincidência estava no Twitter agora combinando de visitar amigos do Rio, que tiro onda, como de tudo mais na vida, mas adoro.

Fernando disse...

Ah, tudo bem entao, Alexandre! Algumas vezes tambem faco um comentario que acaba caindo meio mal no meu blog (inclusive, uma vez inclusive foi sobre SP), diferente do que eu tinha pensado qdo escrevi.

Desculpa pela patrulha do politicamente correto entao!

Abracos,
Fer