quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Conceitos sobre Sistemas Econômicos e de Governo

(clique que a imagem aumenta: A queda do diabo, do artista Gustave Doré)

Desde que o homem inventou o dinheiro, o Diabo viu ali a chave para a dominação dessa espécie. Talvez tenha sido inventado por uma mulher, visto que têm tradição histórica pela cupidez e costumam ajudar o tinhoso desde o Jardim do Éden.

Do dinheiro veio a produção, a exploração do próximo e toda uma série de coisas apenas dignas de serem guardadas na caixa de Pandora. Deviam, de fato, lá estar enclausuradas, mas a tolinha abriu a caixa (mais uma vez uma mulher).

Daí para os ditos sistemas econômicos, foi um pulo. A sociedade humana nunca conseguiu um que fosse nem razoavelmente justo. Sobre esses conceitos assentaram-se sistemas de governo, também com inúmeros viéses. Diz-se que a democracia é o menos ruim, mas ultimamente governos mais ou menos ditatoriais e/ou teocráticos têm tentado se esconder atrás de um verniz barato de democracia. Procuremos dar as cores próprias e diferentes às ideias diferentes.

Bem perto de nós brasileiros, Venezuela, Equador e Bolívia têm se arvorado em "refundar" os seus países - o que quer que seja isso. Pena que baseando-se em teorias sociais e econômicas do século passado, testadas com resultados desastrosos em inúmeros países, países estes cujos povos tão logo puderam rechaçaram tais sistemas - genericamente chamados de socialistas. Mas o que seria o socialismo? Socialismo é um saco de gatos que incluiu desde seus primeiros teóricos (ditos utópicos), até o início do governo nazista na Alemanha de Hitler. Em geral nunca foi filosoficamente seguido pelos governos que diziam adotá-lo, mas sempre foi eficiente em eliminar (por mortes, campos de concentração ou prisões políticas) tanto os utópicos acima referidos quanto quaisquer cidadãos que discordassem do pensamento majoritário do governo. Artistas, civis de todos os matizes e até mesmo militares foram perseguidos. Todos os países que o seguiram, sem exceção, amargaram atrasos tecnológicos de décadas, sistemas produtivos ineficientes, e fiscalização de qualidade e segurança precários ou inexistentes.

Citemos dois exemplos:

  1. Na extinta URSS, apesar de potência militar e com tecnologias espacial e nuclear, no resto o avanço tecnológico era pífio. Pessoas morriam por receberem antibióticos ineficazes. As fábricas eram cobradas por produção, e assim produziam a maior quantidade possível de ampolas/comprimidos, porém com concentrações abaixo dos critérios internacionais mínimos. Nos anos 1990, geladeiras, televisores, computadores, carros, quase tudo era baseado em clones da tecnologia ocidental de 10 a 30 anos atrás, e acessíveis apenas à elite política alinhada.

  2. Cuba é um triste museu vivo em que tudo isso pode ser observado nos dias atuais.

Um sistema que teorizava a propriedade coletiva através do Estado, compensação igualitária dos indivíduos e igualdade de oportunidades desembocou em regimes totalitários, com sofrimento de parcela majoritária da população e privação de direitos individuais mais elementares. Alguém conhece alguma exceção?

Vimos também no ilustrativo Século XX povos considerados cultos e desenvolvidos como alemães e italianos darem o poder, inicialmente pelo voto, sempre depois um direito perdido, aos filhotes do Fascismo e suas variantes. Como bem demonstrado no filme e HQ homônimos V de Vingança, a ascensão de governos fascistas ao poder geralmente se dá em situações econômicas e sociais adversas, em que a população sente-se acuada.

O Fascismo é uma ideologia de matizes necessariamente autoritários e nacionalistas, que é proposta como solução / panaceia para problemas sociais, econômicos e políticos graves, como na Alemanha entre as duas grandes guerras. Uma vez no poder, rapidamente mostra as garras e as armas, propondo, sem tolerância a discordantes, um país de partido único, comandado por um ditador quase divino. Usa e abusa de propaganda oficial para incutir nos indivíduos a necessidade de submeterem-se aos ditos interesses coletivos da nação e/ou da raça.

Como torna-se rapidamente perceptível que problemas graves, especialmente tratando-se de nações, não são resolvidos com bravatas ou xenofobia, rapidamente surge a necessidade de se nomearem inimigos do Estado e da raça, bodes expiatórios, como o foram judeus, deficientes, imigrantes, homossexuais, dentre outros. As consequências, infelizmente, nos são bem conhecidas. Genocídio, crimes, guerras.

Por terem penetração incisiva e promover rápidos resultados políticos, ideias de viés fascista ou mesmo abertamente fascistas não raro pipocam mesmo nos dias de hoje. Atualmente vemos a Itália flertando perigosamente com o bloco político de Berlusconi. Ainda que tenha sido eleito, não respeita as instituições, e desqualifica os interlocutores que dele discordam, como o fez recentemente com o próprio presidente do país.

Os atuais países que perigosamente pendem para o socialismo e o fascismo tentam justificar-se através de eleições ganhas com a manipulação do eleitorado ou com o uso pesado da máquina do Estado. Geralmente permite-se, como moeda de troca eleitoral, que maiorias esmaguem direitos igualitários de minorias. Uma vez aboletados no poder, tais governos rapidamente pegam nojo e desprezo pelo diferente, pelo pensamento dissidente, pelas eleições diretas e pelos legislativos. Vejam o sistema eleitoral longevo de Cuba e os poderes legislativos excepcionais de que Chávez se arvorou recentemente. Mas todos se declaram democráticos e obedientes ao povo.

Claro que quem escreve estas linhas já tem opinião, mas, sem ideias pré-concebidas ou questões de fidelidade partidária baratas, como saber se não estamos sendo preconceituosos e tendo medo de nações com sistemas políticos democráticos e apenas diferentes de nossa concepção? Para isso, discutamos brevemente o conceito de Democracia.

Palavra que aprendemos ser bonita desde os tempos de escola, a herdamos do termo grego dimokratia, que significa poder/força do povo. É a forma de governo na qual o poder é exercido direta ou indiretamente pelo povo, com eleições livres e justas, espaçadas por curtos períodos de tempo.

Conquanto não haja definição consensual de democracia, TODAS são permeadas por três conceitos básicos:

  1. todos os cidadãos devem ter igual oportunidade de acesso ao poder;

  2. todos os cidadãos desfrutam de liberdades e direitos fundamentais reconhecidos e;

  3. deve haver alternância entre os indivíduos ou grupos no poder.

O principal perigo do regime democrático é a dita "ditadura da maioria", que pode descambar para quadros fascistoides. Isso é evitado através da Instituições Democráticas, com a divisão dos poderes e independência efetiva entre os mesmos, gerando um sistema dito de pesos e contrapesos, especialmente para assegurar o item 2 logo acima.

Como brasileiros, vivemos recentemente longa ditadura da direita através dos militares, fruto de um golpe propagandeado como revolução, com os consequentes Anos de Chumbo. Infelizmente observo que os mais jovens subestimam as consequências nefastas da época, ou simplesmente a desconhecem. Falha de nosso sistema escolar. Com esses regimes de países vizinhos insidiosamente instalando-se, creio que precisamos manter cuidado e resguardar nossa tão duramente conseguida democracia, ainda que imperfeita. Sem ela, como chineses e iranianos e cubanos, estaríamos até impedidos de blogar. Eu não poderia postar este texto e vocês não poderiam lê-lo.




4 comentários:

Pavinatto disse...

Há quem diga que o papel-moeda advém dos conselhos de Mefistófeles (diabo) a um imperador. Mas não é em torno do dinheiro que gravita seu ensaio, mas em torno do poder, que, aos homens, é mais difícil e mais tentador. Belíssimo ensaio e, de fato, sincronizado com meu desabafo através das palavras no Magnoli, que você, gentilmente, divulgou aqui em nosso (mais seu) RH. Desespero e ignorância espiritual, falta de capacidade de raciocinar de filosofar, ensino precário, formação de cidadãos de papel (como diria o Dimenstein - apesar de não comungar dos mesmos ideais que ele) passíveis a só dizer sim. A esperança que ficou na boceta de Pandora é vítima de usurpadores: oportunistas demagogos que dela se travestem e provocam o caos político como Grandes Líderes.

Se a democracia é o poder do povo, a república é a RES pública, é a coisa do povo e, infelizmente, coisa do povo, hoje, é loja barata e objeto de menor valor.

Medo? Medo sim. Mais como homossexual assumido do que como cidadão.

Medo da passividade da grande maioria, maioria literalmente esmagadora.

Medo e angústia, angústia de ver meus pares alienados, de corpos sãos e mentes vazias. Descompromissados, imprudentes sem esse medo.

Falta parar para pensar (e isso sempre dizia meu professor de Filosofia CELSO LAFER). E quando tudo isso acontece, ao surgir qualquer um com discursos messiânicos e falaciosos, tem passagem a anti-democacia.

Assunto para pod cast.

Baci

Alexandre Lucas disse...

Para ser sucinto depois do texto longo e de seu comentário gentil:
- o blog é nosso, nem mais meu, nem mais seu. É apenas uma proposta de colaboração e pontos de vista, não algo meramente pessoal. Acho mais enriquecedor.
-a podcast we shall have! Logo depois do carnaval!

E.S. disse...

Adorei o texto. Fazia tempo que não lia algo tão bom e sucinto sobre o tema.

BHY disse...

Não existe regime perfeito porque não somos perfeitos. Nem sozinhos e muito, mas bem muito, menos juntos. A democracia é o menos pior dos sistemas, mas só se consegue a verdadeira com muita e boa educação, não apenas aquela das escolas. Isso só se vê em poucos lugares, como Bélgica ou Suécia. Aqui? Só daqui uma boa dezena, ou centena, de anos. Adoro os textos cabeça.
;-)